Higiene: O AMBIENTE

Lembrando o aspecto da dignidade da pessoa, ao qual aludimos repetidas vezes, não é digno do ser humano um ambiente para viver que não tenha seu desenho e condições marcados pela sua racionalidade e condizentes com sua dignidade. A casa deve ter uma arquitetura que lhe traga conforto e facilite o cumprimento de suas tarefas, inclusive a de bem abrigar e criar sua família quanto a todas as suas necessidades. A boa higiene é marca dessa racionalidade e do empenho pela dignidade..

A casa. Os compartimentos da casa devem ser mantidos varridos e encerados, livres de animais que trazem parasitas, espalham pêlos e oleosidade mau cheirosa por onde andam. Os sofás e poltronas, os carpetes e tapetes, e o assoalho devem estar limpos com produtos de limpeza adequados, de modo a que restos de comida, cabelos, gordura e células deixadas pela epiderme humana não alimentem os ácaros e não retenham a poeira que contem fezes desses minúsculos e invisíveis artrópodes.

O quarto de dormir. O conforto para um bom descanso não depende só de como o quarto de dormir está equipado, mas principalmente de que seja um ambiente limpo e isento de insetos parasitas. Um costume que está muito difícil de ser aceito no Brasil é a telagem das janelas dos quartos. Nem a indústria se empenha em produzir materiais adequados e baratos para esse fim, nem o Ministério da Saúde liga a mínima importância à questão. No entanto, faz uma diferença enorme um quarto telado, cuja porta dá para um corredor que tenha a porta sempre fechada, se apenas as janelas dos quartos forem teladas (O ideal é que a casa tenha todas as janelas e portas teladas). A diferença está em não ser a pessoa incomodada pelos mosquitos (muriçocas) enquanto descansa ou dorme. Se o hábito fosse implantado, a mais modesta família não teria dificuldade em adquirir um metro quadrado de tela e quatro sarrafos aproveitados de um caixote de madeira para telar a janela do seu barraco. Não se trata de evitar doenças como filariose, dengue, malária, e outras transmitidas pelos mosquitos, embora a tela na janela possa diminuir os ricos da picada desses insetos transmissores; trata-se do conforto para dormir.

Além da tela na janela, o quarto precisa ser mantido limpo. Não havendo tempo pela manhã para arrumar a cama, é melhor que os lençóis, cobertas e cobertores sejam apenas dobrados e deixados sobre a cama para serem postos mais tarde, num horário em que a pessoa possa fazer a arrumação com calma, examinado o colchão e também a grade do estrado da cama à procura de insetos. É comum a pessoa trazer do transporte coletivo e dos cinemas percevejos e pulgas. Arrumar a cama com cuidado, colocando inseticida se necessário, é fundamental para a higiene do quarto.

Ao varrer o quarto é preciso evitar levantar poeira. Para isso varre-se levemente as partículas maiores que estejam no assoalho diariamente e pelo menos uma vez por semana passa-se pano úmido no chão e flanela úmida nos moveis. Nas frestas do chão e dos móveis abrigam-se os ácaros, as pulgas, as miúdas mariposas que se transformam em traças, e as aranhas que se alimentam daquelas. Borrifar inseticida caseiro se notar que os cuidados acima não foram suficientes.

Banheiros. Banheiro se usa de porta fechada. Os ruídos inevitáveis devem ficar abafados entre as quatro paredes do banheiro, por mais íntimos que sejam os moradores, e mesmo que esteja em casa apenas o casal. Os homens normalmente se esquecem desse cuidado e, com a porta aberta, deixam ressoar pela casa o ruído de grossas vertentes sobre a água do vazo da privada. Em banheiros no centro do apartamento, ou de casas pequenas, é mesmo necessário dar descarga no vazo ou abrir a torneira para dissimular outros ruídos. Se a pessoa está só em casa e precisa deixar a porta entreaberta para ouvir o toque da campainha da rua ou do telefone, deve certificar-se de que a porta de entrada da casa está trancada e não terá a surpresa de alguém que entre inesperadamente.

O banheiro deve estar sempre impecavelmente limpo. Não é o lugar para acumular roupa suja em sestas, pois dá mau cheiro. É necessário que haja pelo menos um tapete, preferencialmente de cor clara ou branca, ao pé da pia. Alguns frascos de loução ou colônia bem desenhados podem ser deixados sobre o balcão, dispostos esteticamente, mas vidros comuns devem ser mantidos dentro do armário. A escova de cabelo com cabo de prata pode fazer parte da decoração do balcão, mas uma escova comum é preferível que seja guardada numa gaveta; em um e noutro caso, no entanto, deve estar absolutamente limpa, sem um único fio de cabelo. O mesmo se aplica aos pentes, cujas hastes também precisam ser limpas do resíduo de poeira oleosa que retiram dos cabelos.

Havendo uma banheira, esta precisa estar limpa daquela leve pátina gordurosa que se forma ao nível da água, quando usada. O mesmo com a pia, que não deve ficar com manchas de dentifrício e espuma seca de sabão, ou com fios de cabelo espalhados na bacia. O sabonete também deve ser lavado após o uso, para não ficar com manchas de sujo, nem odores de partes íntimas em que tenha sido usado.

O tubo de dentifrício deve ser bem fechado e deixado no armário, como também a escova de dentes; não são peças para ficar em exibição.

Ao terminar de usar o banheiro, corra os olhos pelo ambiente e veja o que pode ser limpo e reposto nos lugares. O tapete deve ser deixado bem estendido, o vaso sanitário limpo, com a tampa baixada.

Os banheiros públicos. Os donos dos banheiros públicos são aqueles que deles se utilizam, e que devem, no seu interior, ter o mesmo cuidado e o mesmo respeito pelos outros que também irão usá-lo, tal como fariam em suas próprias casas. Mas há uma dificuldade compreensível para o usuário do banheiro público: a aversão natural que se tem em utilizar instalações que foram usadas por estranhos e o seu receio de se contaminar com alguma moléstia contagiosa. As pessoas então recorrem a posições acrobáticas para evitar o contacto com qualquer peça no banheiro, e não querem tocar sequer no botão ou alavanca de descarga. Porém, se não falta papel higiênico, ele pode ser utilizado na solução do problema. Um pedaço de papel permitirá à pessoa abrir a torneira da pia ou apertar o botão de descarga sem tocar diretamente no metal. Se há um mínimo de limpeza no banheiro, pode inclusive forrar com a fita do papel higiênico o assento do vaso e utilizá-lo com mais conforto. Atenção, porém, para não exagerar no uso do papel, deixando pouco ou nenhum para quem vier depois. Se você esgotou o rolo de papel, avise o responsável ou o atendente a fim de que seja reposto.

Se você encontra um banheiro sujo, com o botão ou alavanca de descarga que não funciona, ou faltando água, papel higiênico, pia e sabão para lavar as mãos, você não deve reclamar com o proprietário nem com a administração local. Isto jamais funciona, e você corre o risco de sofrer um desacato. Você deve telefonar para o Serviço de Fiscalização da Prefeitura, e denunciar a irregularidade. O número desse telefone deve estar afixado, por Lei, de modo bem visível no interior do banheiro e se não estiver, essa é mais uma irregularidade que você, como um bom brasileiro, deve denunciar prontamente. Quando todos os brasileiros aprenderem a ter higiene e a ter sua pessoa respeitada, o nosso país certamente vai mudar de rosto.

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NOTAS:

Ácaros. Esses minúsculos animais artrópodes, os ácaros, têm sido, recentemente, objeto de muitas referencias nos meios de informação, principalmente em relação a doenças alérgicas. Seu papel no desencadeamento de reações asmáticas através da poeira tem sido muito difundido. São invisíveis à vista desarmada, devido ao seu tamanho quase microscópico, tendo apenas cerca de 0,3 mm de tamanho. Os nomes científicos de algumas espécies mais comuns: dermatophagoides farinae, blomia tropicalis e dermatophagoides pteronyssinus.

Os ácaros não são diretamente responsáveis por qualquer doença, porém o são indiretamente; o que integra a poeira e causa as alergias respiratórias são as suas fezes. Alimentam-se de farelos de comida retidos nos cantos e gretas dos sofás e poltronas, nos carpetes e tapetes, gretas do assoalho e dos rodapés; de células da epiderme humana retidas nas cobertas das camas, tatames, em brinquedos como ursinhos de pelúcia, e nos forros dos assentos; e também de fungos que se desenvolvem no interior das residências.

Algumas pessoas são particularmente afetadas pela poeira que contem os micro excrementos de ácaros, e em conseqüência sofrem de surtos de asma e rinite crônica, entre outros males. Os ácaros são combatidos eliminando-se a poeira do piso, dos móveis, dos tecidos e tapetes, e o mofo em paredes e armários. Existem vários produtos anti-ácaros, inclusive capas especiais para colchões e travesseiros e almofadas. Não parece que seja muito eficiente o aspirador de pó, uma vez que, devido ao seu tamanho minúsculo, os ácaros poderão não ficar retidos no filtro e assim voltar ao ambiente. Passar pano úmido no assoalho talvez seja a melhor solução, o que permite a adição de produtos acaricidas.

Percevejos de cama. Os percevejos fazem uma mordida capaz de deixar um sinal na pele e mesmo causar inflamação por vários dias. São arredondados e têm uma carapaça córnea, sendo do tamanho de até meio centímetro de diâmetro. Foram uma grande praga na Europa e mesmo hoje, podem ocorrer em hotéis pouco higiênicos ou de alta rotatividade, e mesmo em dormitórios de internatos; viajando nas malas e nas roupas das pessoas, passam aos assentos dos coletivos e são daí levados por elas para contaminar suas residências. Nos ambientes onde o forro é de madeira ou de treliça, os percevejos podem morar no teto e descer à noite para as camas. Porém é mais comum que fiquem nas frestas e nos engates das laterais da cama, na prega das costuras do colchão, etc. Ficam escondidos durante o dia e à noite saem a procura de um hospedeiro. Escondem-se com grande rapidez. Porque costumam subir pelos pés da cama, picam principalmente na perna da pessoa que dorme, junto ao tornozelo, ou na região de pescoço. Apesar de sugar o sangue da vítima, não se detectou doença da qual o percevejo seja o transmissor.

Rubem Queiroz Cobra